segunda-feira, 13 de agosto de 2007

Capítulo XI - O Batismo - Institutas (E) Vol 3, pg 141-144

Capítulo XI - Vol 3, pg 141-144

O Batismo

1.Objetivos da instituição do Batismo

[1536] O Batismo nos foi dado por Deus primeiramente para servir à nossa fé naquele que o instituiu e, em segundo lugar, para servir à nossa confissão dessa fé perante os homens. Trataremos nessa ordem desses dois objetivos e motivos da sua instituição.

Quanto ao primeiro objetivo, o Batismo faz três benefícios à nossa fé, os quais é necessário examinar separadamente, um por vez. Primeiro, o propósito de Deus é que ele seja um símbolo e um sinal da nossa purificação, ou, melhor dizendo, foi-nos enviado por Deus como uma mensagem pela qual ele nos comunica, confirma e assegura que todos os nossos pecados foram perdoados, cobertos, abolidos e cancelados de tal maneira que jamais serão apresentados à sua consideração, nem recordados para nova remissão, nem imputados a nós. Nesse sentido, ele quer que todos os que crerem sejam batizados para a remissão dos pecados [Mt 28.19; At 2.38]. Por isso, aqueles que se atreveram a escrever que o Batismo não é senão uma marca e um símbolo pelo qual declaramos diante dos homens a nossa religião, como um soldado leva a farda e a insígnia do seu príncipe para com isso declarar-se subordinado a ele, deixaram de considerar o principal do Batismo, a saber: que devemos recebê-lo com a promessa de que os que crerem e forem batizados receberão a salvação [Mc 16.16].

2. Fundamentos bíblicos

Nesse sentido, se deve entender o que apóstolo Paulo escreveu [Ef 5.26], que Cristo se entregou pela igreja, sua esposa, “para que a santificasse, tendo-a purificado por meio da lavagem de água pela palavra”, isto é, pelo Batismo com água. E noutros lugar [Tt3.5], que, “segundo a sua misericórdia, ele nos salvou mediante o lavar regenerador e renovador do Espírito Santo”. E também o que o apóstolo Pedro escreveu [I Pe 3.21], dizendo que o batismo nos salva. Certo é que o apóstolo Paulo não quer dizer que o nosso lavamento e a nossa salvação sejam realizadas perfeitamente por meio da água; nem que a água contenha alguma virtude ou poder para nos purificar, regenerar ou renovar. Tampouco o apóstolo Pedro quis dizer que a água é a causa da nossa salvação. Eles somente quiseram dizer que no sacramento se recebe a segurança de tais graças. As próprias palavras empregadas explicam isso claramente. Porque o apóstolo Paulo junta a Palavra da vida, que é o evangelho, ao batismo com água, como se dissesse: pelo evangelho nos é anunciada a nossa purificação e santificação, e pelo Batismo esse anúncio ou essa mensagem é simbolizada e selada. E o apóstolo Pedro, depois de dizer que o Batismo nos salva, imediatamente acrescenta: “não sendo a remoção da imundícia da carne” que o faz, “mas a indagação de uma boa consciência par com Deus”, que provém da fé.

[1539] Por outro lado, porém, o Batismo não nos promete outra purificação que a que é feita pela aspersão do sangue de Cristo, representado pela água por sua semelhança com esta, em sua função de lavar e purificar. Quem, pois, dirá que nós somos purificados pela água do Batismo, sendo que ele testifica que o sangue de Cristo é o nosso verdadeiro e único lavamento, a nossa verdadeira e única aspersão? [1 Pe 1.2] Assim, não se poderia encontrar melhor argumento pra refutar o erro daqueles que atribuem tanta virtude à água do que demonstrando o sentido do Batismo.

3 Remissão dos pecados passados e futuros

[1536] Não devemos achar que o Batismo nos é dado unicamente para atestar solução para o passado, de modo que para os pecados que voltemos a cometer depois de termos sido batizados precisamos encontrar outra solução, um novo remédio. Certamente desse erro procede o fato de que antigamente alguns não queriam ser batizados senão no fim da sua existência na terra, na hora da sua morte, para que assim obtivessem pleno e completo perdão para toda a sua vida. Contra essa tola fantasia os bispos falaram muitas vezes em seus escritos.

[1536] Mas devemos saber que em qualquer tempo em que sejamos batizados, somos lavados e purificados uma vez por todas e por todas e por todo o tempo da nossa vida. Por essa razão, toda vez que cairmos em pecado devemos recorrer à lembrança do Batismo e por ela nos confirmar e nos fortalecer na fé, para que estejamos sempre certos e seguros do perdão dos nossos pecados. Porque, embora pareça que, por nos ter sido administrado uma só vez, o Batismo já tinha perdido o seu efeito, todavia ele não é cancelado ou apagado pelos pecados subseqüentes. Porquanto a pureza de Cristo nos é oferecida nele, e a sua pureza está sempre em vigor, dura para sempre, e não há mancha que a possa sobrepujar. A pureza de Cristo elimina toda a nossa sujidade e nos purifica de toda a nossa imundícia.

Contudo, não devemos ver nisso ocasião para pecar depois do Batismo, pois é certo que, neste ensino, não há nada que nos incite a essa audácia. Esta doutrina é oferecida unicamente àqueles que, depois de terem cometido pecado, sentem-se desolados, e se lamentam, cansados e sobrecarregados sob o peso dos seus pecados, para que tenham com que se levantar e se consolar, e não fiquem confusos nem caiam no desespero. Por essa razão, diz o apóstolo Paulo [Rm 3.25] que Jesus Cristo nos foi feito, ele próprio, propiciação pelos pecados passados. Com isso ele não quis dizer que nele não temos perpétua e continua remissão dos pecados, até à nossas morte. O que quis dizer é que Cristo foi dado pelo Pai aos pobres pecadores que, feridos pelo cáustico cautério da consciência, suspiram pelo médico. A esses é oferecida a misericórdia de Deus. Mas aqueles que, descansados em sua impunidade, buscam e tomam ocasião e liberdade para pecar, só o que fazem é provocar contra si mesmos a ira e o juízo de Deus.

4. Mortificação e nova vida em Cristo

O segundo consolador benefício que nos fé o Batismo é que nos mostra a nossa mortificação em Jesus Cristo e também a nossa nova vida nele. Porque, com diz o apóstolo Paulo [Rm 6.4], “em Cristo fomos batizados em sua morte” e fomos “sepultado com ele na morte pelo batismo; para que ... também andemos nós em novidade de vida”. Com essas palavras ele nos exorta, não somente a que o imitemos, como se dissesse que o Batismo nos admoesta no sentido de que, à semelhança e segundo o exemplo da morte de Jesus Cristo, morramos para as nossas concupiscências, e que, a exemplo da sua ressurreição, revivamos para a justiça. Não. Ele sobe a maiores alturas e afirma que pelo batismo somos feitos participantes da sua morte, a fim de que sejamos enxertados nela. E como o enxerto extrai a sua substância e o seu nutriente da raiz na qual foi inserido, assim também, aqueles que recebem o Batismo com a fé com a qual ele deve ser recebido, sentem verdadeiramente a eficácia da morte de Jesus Cristo na mortificação da sua carne. E o mesmo se dá também com a sua ressurreição na vivificação do seu espírito. Disso o apóstolo toma ocasião e matéria par nos exortar nos sentido de que, se somos cristãos, morramos para o pecado e vivamos para a justiça. Ele usa o mesmo argumento noutra passagem [Cl 2.11,12], na qual afirma que fomos circuncidados e despojados do velho homem, e então fomos sepultados com Cristo no Batismo. Nesse sentido, na passagem que citamos anteriormente [Tt3.5], ele descreve essa ação como lavamento de regeneração e renovação.

5. A bênção da nossa união com Cristo

[1539] Finalmente, pelo Batismo a nossa fé recebe também esta reconfortante bênção: não somente nos é dada a certeza de que estamos inseridos como enxerto na morte e na vida de Jesus Cristo, mas também que estamos de tal modo unidos a ele que ele nos faz participantes de todos os seus bens. Porque por essa razão, ele consagrou e santificou o Batismo em seu corpo [Mt 3.13], para que fosse um firme laço da comunhão e da união que ele quis ter conosco. Tal é o significado disso que o apóstolo Paulo prova que somos filhos de Deus pelo fato de que pelo Batismo fomos revestidos de Cristo [Gl 3.27}. Vemos, assim, que o cumprimento do Batismo está em Cristo, razão pela qual o chamamos objeto e meta a que o Batismo vida. Por isso não deve causas estranheza que os apóstolos tenham batizado pessoas em nome de Cristo [At 8.16; 19.5], embora tivessem recebido mandamento [Mt 28.19] para batizar em nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo. Porque todos os dons e dádivas de Deus que nos são oferecidos no Batismo se encontram em Cristo e unicamente nele. Todavia, quem batiza em nome de Cristo não pode deixar de invocar igualmente o nome do Pai e do Espírito Santo. Fácil é ver a razão disso, pois, se temos, como é fato que temos, a nossa purificação no sangue de Cristo, é porque o Pai, querendo derramar a sua bondade e a sua clemência, reconciliou-se conosco por meio dele como o Medidor. Como também recebemos a nossa regeneração por sua morte e por sua vida se, santificados pelo Espírito, é por ele edificada em nós uma nova natureza espiritual. Segue-se, pois, que devemos reconhecer que a nossa purificação e regeneração a temos no Pai; a matéria, no Filho; e o efeito, no Espírito Santo. [1536] Vê-se que primeiro João e depois os apóstolos ministraram o Batismo de arrependimento, para remissão dos pecados, entendendo pela palavra arrependimento a regeneração, e pela remissão dos pecados, a purificação [Mt 3.6-11; Lc 3.16; Jo 3.23; 4.1,2; At 2.38,41.].


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Autor: João Calvino
Fonte: As Institutas da Religião Cristã, edição especial, ed. Cultura Cristã, Vol 3, pg 141-144.

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